crônica: Táxi! Táxi!

By Fernando Cássio, em 27/11/2011

O serviço é um dos mais antigos que se tem notícia. Nas ruas da Roma antiga já se utiliza o riquixá. A cidade de São Paulo detém o maior número, com mais de 35 mil veículos cadastrados. Imagine uma cena urbana envolvendo três fatores: falta de veículo próprio; uma situação de emergência e a dificuldade de mobilidade. Não tem como pensar nesse momento, senão num táxi. Ele é a única solução e a melhor invenção para este momento! Caso você seja um contumaz motorista não há como evitar aquela desconfiança inaugural ao embargar. Vários questionamentos ocultos surgem. A rota está correta? Vou ser enganado? Ele dirige tão bem quanto eu? Segure a emoção e siga. Apenas referencie o ponto geográfico para onde deseja ir. Somente! Deixe a cargo do taxista, pois ele não permite nem que o “google maps” ou que o “GPS” faça o serviço. O taxista mantém a cidade, os trajetos e o desenho cartográfico na ponta dos cascos e na memória. Existem algumas táticas que poderão assegurar confiança durante o trajeto. A princípio, assuma a postura de psicólogo. Questione o indivíduo ao volante, na tentativa de descobrir a personalidade do profissional que conduz o seu destino. Neste momento seus batimentos estão a mil! Invoque São Cristovão e São Fiacre, ambos protetores dos motoristas e taxistas. Também, se for devoto, peça a intervenção de São Expedito.

Para facilitar a vida dos passageiros, minimizar a tragédia e acalmar a pressão arterial, vamos relacionar alguns tipos mais comuns de taxistas, identificando as características psicológicas mais marcantes daqueles que labutam e trafegam diariamente no cotidiano das cidades:

• Babá – encarna a tarefa dos ausentes pais ocupados. Assume o frete pelo transporte das crianças, nas atividades educacionais e sociais. Tem paciência acima da média da população.
• Adotivo – assume o frete pelo transporte dos idosos, apoiando todas as demais atividades geriátricas. Assume a responsabilidade dos familiares sempre ocupados.
• Azarado – sua principal tarefa é transportar as sogras alheias. Ouve tudo que ela diz em excesso e não retruca. Também não comenta nada com os vitimados genros e noras.
• Eunuco ou ursinho carinhoso – é o fiel escudeiro do marido ocupado. Leva a esposa para todos os lugares possíveis. Muitas vezes, termina assumindo, por completo, a tarefa do chefe da família.
• Frete pago – trabalha exclusivamente na noite com o transporte de enfeitadas senhoritas, solicitadas por ávidos clientes. Discreto. Além do valor do taxímetro, abocanha parcela dos interessados. Atua numa rede social ativa e dinâmica.
• Ariano – é aquele contador de causos nordestinos, com riqueza de detalhes e arrudeio. A corrida acaba e você fica sem saber o final da estória.
• Profeta – é o tipo adivinhador e de pouca conversa. Utiliza-se das expressões “hoje vai chover”, “tá calor”, “vai engarrafar”, etc., para manter um grau mínimo de relacionamento com o passageiro. Despretensiosamente funciona como um twitter ao volante.
• Politizado – é um verdadeiro comitê ambulante. Sempre está disponível para fazer uma rápida análise política do momento. Conhece tudo sobre a cidade, pois consome diariamente as informações das rádios. É democrático até saber em quem você vota.
• Manchete ou jornalista – conhece os detalhes da vida de todos, inclusive da sua. Guarda datas, circunstâncias e fatos que você queria esquecer. É o jornal e o facebook das manchetes urbanas.
• Galanteador – detém o título declarado de maior conquistador do mercado. Evita corrida masculina. É o conselheiro sentimental da hora. Tem um longo acervo de estórias mirabolantes, envolvendo suas passageiras. Apresenta-se como a solução para os problemas femininos. É o galã do volante.
• Home bank – é o facilitador financeiro. É praticamente uma agência bancária itinerante. Troca dinheiro, faz pagamento, aceita cheque, aceita cartão, efetiva penhor, pendura a conta e faz promoção.
• Anjo da Guarda– tem a árdua tarefa de conduzir os bêbados até as suas residências. Trabalha na madrugada. Dispõe de um arsenal para primeiros socorros. Não tem vício. É crente. Desenvolveu um dialeto próprio para a comunicação com os alcoólatras e ressacados. Conhece todos os pontos de café matinal da cidade.
• Estiloso – possui um jeito próprio e incomum. É o figurinista do veículo e do seu próprio uniforme. Valoriza negativamente o veículo enfeitando com redinha, cachorro de porcelana que balança a cabeça, gato de pelúcia que acende os olhos, teto com luzes de várias cores, forro de onça nos bancos e no volante, caranguejo na marcha, pneu tala larga, jantes brilhosas e um som digno de qualquer boate de beira de estrada.
• Piloto – se disfarça de taxista para exercitar ao pé da letra a palavra “corrida”. Está sempre à frente dos demais e em velocidade superior à máxima permitida. Transmite gratuitamente ao passageiro a mesma sensação de estar em uma montanha russa. Conversa pouco e acelera muito.
• Cascão – mantém em conjunto com seu veículo, um destacado aroma impopular. É uma mistura química e biológica que invade, com ardência, as narinas alérgicas dos passageiros, atordoando o olfato e o pensamento. Tende a provocar náuseas nos desavisados. Nessa circunstancia até a ventilação se esconde e você reza para a viagem acabar.

Agora, a sorte está lançada. Façam uso do serviço e exercitem a análise. Não esqueçam que estes profissionais estarão sempre prontos e atentos para ajudá-los. Não há dúvida que a interminável jornada será um rali urbano, sendo você o co-piloto, sem direito ao plano de navegação. Aproveite o espírito aventureiro para curtir as ruas esburacadas da cidade e os engarrafamentos. Como todos os problemas do país serão resolvidos até a Copa do Mundo, então asseguro que haverá apenas uma bagunça coloquial no futuro. A mistura dos “oxente” e dos “please” em cada táxi. Que haja paciência e não haja xenofobia. E que todos os santos, em comunhão, ajudem também.

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